quarta-feira, 5 de maio de 2010

Irajá, cujo nome mesmo era André, filho de Marta e Maurício D. Battistini – este, engenheiro e presidente de uma das maiores companhias construtoras da cidade –, além de fazer administração, há tempos já trabalhava na empresa da família, sendo o braço direito do pai. Com um precoce senso de responsabilidade, e por irmãos, uma dupla que, o que não tinha de talento para dar duro, tinha de sobra para gastar, e esbanjar a verba paterna, com pesar, acabou adiando o sonho de fazer oceanologia ou biologia marinha, ciências que o deixavam perto de sua verdadeira paixão: as águas. Mas desde quando paixões deveriam ser ouvidas?... Sabia como fora duro, para seus bisavós, o começo nessa nova terra. E seu avô, com um bom tino para os negócios, inabalável dedicação, e obstinada coragem, criara a empresa. Que, no início, oferecia apenas mão de obra e confiabilidade; e depois, com Maurício já formado em engenharia – com muito sacrifício, empenho e grande satisfação de seus pais –, além dos valores já estabelecidos, modernas e inovadoras técnicas – vindo mesmo a tornar-se uma referência no ramo da construção civil. No sobe e desce da economia, sobrevivendo a tempos difíceis, e outros nem tanto, seu pai soubera mantê-la, formando o patrimônio atual. Com isso, a André não cabia outra coisa que continuar o que até ali fora feito. Mas, dentro de si, em algum lugar sagrado e impenetrável, sabia existir um menino inocente, até certo ponto crédulo, e cheio de expectativas. Morando com os pais e os irmãos no elegante bairro de Três Figueiras, entre a administração e a empresa, por ora desafogava um pouco a pressão, velejando pelas águas do Guaíba. Sentindo os caprichos dos ventos, adivinhando as virações, descobrindo e aventurando-se em pontas e ilhas, além de deixar-se levar em tardes de calmaria pela brisa que docemente tocava seu rosto e arrepiava seus pêlos, enquanto assombrava-se com o sempre renovado espetáculo do pôr do sol, era como mantinha o elo com seu sonho distante. Já na vida social, por gostar muito de música, não fazia feio nas pistas; mas, ao contrário dos outros membros da família, fugia, na medida do possível, das colunas sociais das quais eram assíduos. Na verdade, sentia que sua vida estava em compasso de espera.

O aparecimento de Obirici na sua tela foi como um sinal de que alguma coisa, afinal, começava a fazer sentido. Todavia, como a criança, que tendo medo que lhe tirem o brinquedo que acaba de ganhar, evita afeiçoar-se muito a ele, tinha medo de entregar-se por inteiro a qualquer sentimento.
Até que, vendo chegar mais um fim de semana de primavera, e, com as previsões meteorológicas sinalizando um tempo estupendo, arriscou:

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